Interior paulista já é o maior mercado consumidor do País
Caipira e Cosmopolita. Tradicional e moderno. Conservador e Inovador.
Durante muito tempo essas características definiram, respectivamente, o
perfil inverso do consumidor que vive em pequenas cidades do interior e grandes metrópoles. Não mais. Com acesso a informações, o consumidor está muito atualizado sobre as alternativas que têm e sabe identificar quando um negócio não oferece o que ele espera. Embora São Paulo seja a queridinha quando o assunto é consumo, pequenas cidades do interior do Estado têm funcionado como lubrificante na engrenagem da economia brasileira.
A globalização, as redes sociais, a popularização do comércio eletrônico, a migração da indústria e de grandes empresas para o interior –tudo isso contribui para que dados geográficos não sejam determinantes no comportamento de consumo de uma população, especialmente, no Estado de São Paulo.
POTENCIAL DE CONSUMO
Projeção de estudo do Boston Consulting Group (BCG) indica que as famílias de classe média alta das cidades do interior do país vão representar, até o próximo ano, um mercado que movimentará acima de US$ 600 bilhões.
No estudo, a consultoria constata que as cidades do interior oferecem
oportunidades de crescimento para bens de consumo e serviços, especialmente para setores como serviços financeiros, vestuário e automóveis que operam exclusivamente nas principais cidades do Brasil.
A falta de lojas físicas renomadas é apontada como a principal razão que
explica por que os consumidores do interior gastam muito menos em
determinados segmentos do que os que residem em grandes centros.Cerca de 5,5 mil cidades do interior não possuem qualquer atendimento
bancário na modalidade premium. Das 98 cidades do interior com mais de 5 mil famílias abastadas, 60 não possuem concessionárias especializadas na
comercialização de veículos de luxo, constata o BCG.
O interior paulista já é considerado o maior mercado consumidor do País. De acordo com o levantamento feito pela IPC Marketing, consultoria que estuda o potencial de consumo de todo o Brasil, o interior representa 53,4% do consumo do Estado, ante 46,6% da capital e região metropolitana.
Na região do Vale do Paraíba, por exemplo, há duas cidades entre as 15 com
maior potencial de consumo no interior. São José dos Campos é o quarto
município do ranking, com potencial de consumo de R$ 17,6 bilhões em 2018, o que representa 2,68% do total do interior paulista. Taubaté é a 12ª cidade na lista com um potencial superior a R$ 8 bilhões.
Pela internet, o consumidor do interior já gasta mais que o da capital. Um
dos motivos para esse comportamento é que no interior não há tantas opções de lojas como na capital.
No terceiro trimestre de 2018, o tíquete médio da capital foi de R$ 407,61
ante R$ 415,93 da média estadual. Em cidades como Campinas e São José do Rio Preto, o valor chegou a R$ 419,12 e R$ 488,84, respectivamente.
A EXPERIÊNCIA DO INTERIOR
Todos esses dados são facilmente visíveis quando se mora em uma cidade como Limeira, com 270 mil habitantes e distante 143 quilômetros de São
Paulo. Apesar da constante chegada de grandes redes de supermercados, moda e alimentação, o mercado consumidor ainda é carente quando o assunto é tecnologia e livrarias, por exemplo, ao se considerar o poder de compra da população.
Em cidades menores, não existem tantas opções de produtos e entretenimento como encontramos na capital. Sintetizando: ou o consumidor se adapta com o que o varejo local oferece ou recorre à cidades
maiores da região.
Campinas e Sorocaba reúnem uma boa seleção das marcas queridinhas pelos paulistanos – Zara, Forever 21, Livraria Cultura, Vivara, Outback e Etna são alguns dos nomes que levam muitos consumidores a viajar de uma cidade para outra, exclusivamente para consumir em lojas maiores e mais elaboradas.
“Algumas cidades já são polos de consumo no interior há algum tempo. As grandes redes começam pelas cidades maiores e, assim, atingem também os municípios médios e pequenos da região”, diz Marcos Pazzini, diretor da IPC Marketing.
Durante muitas décadas, esses endereços receberam centenas de excursões com consumidores de toda parte do estado. Hoje, de acordo com Pazzini, esse deslocamento é feito, majoritariamente, por pequenos comerciantes com o objetivo de adquirir produtos para revenda.
Ir até São Paulo para jantar ou realizar alguma compra específica era algo
muito comum para Samarah Freitas, 32 anos, fisioterapeuta, que vive em
Indaiatuba, a 105 quilômetros da capital. Mas nos últimos dois anos, ela tem
trocado o trânsito das Marginais pela tranquilidade das estradas.
Os 28 quilômetros que a distancia de Campinas são percorridos quase que
semanalmente, quando Samarah quer sair para jantar ou fazer compras.
“Tínhamos o hábito de visitar o Mercado Municipal para almoçar, mas dois
restaurantes abriram filial em Campinas. E com a reforma do Shopping
Iguatemi muitas lojas que só existiam em São Paulo vieram para cá”, diz.
A fisioterapeuta cita também a recente abertura de estabelecimentos como
Olive Garden, Paris 6, L’Entrecôte de Paris, Reserva, Pati Piva e Lindt como
atrativos gastronômicos de Campinas.
COMÉRCIO DE RUA
Muito relevante para a economia da cidade, o comércio de rua dessas pequenas retrata bem a dinâmica e o poder de consumo de cada uma delas.
Caminhando pelos bairros comerciais é bem evidente as classes sociais
predominantes. Em Limeira, por exemplo, na parte baixa do Centro estão as
lojas destinadas à baixa renda com preços populares e peças de menor
qualidade – na parte alta estão as grandes butiques, como a Apparence
Maison, em Piracicaba, que comercializa peças assinadas por Patrícia
Bonaldi, Cris Barros e Ricardo Almeida. Tratam-se de estabelecimentos com
preços elevados e similares aos bairros mais abastados da capital.
Já à classe média cabe uma missão quase impossível – garimpar itens a preços módicos em lojas de rede. Ocorre que pela baixa rotatividade, grandes varejistas, como Renner e C&A, normalmente, instaladas em shoppings, limitam a chegada de tantas coleções a essas lojas, que passam meses com as mesmas araras e vitrines.
Enquanto isso, lojas de grandes certos urbanos oferecem megastores com maior número de coleções e alta rotatividade de peças. “Na Capital, a opção do consumidor por comprar em shopping é mais intensa, por questões como segurança e facilidades de estacionar”, diz Pazzini.
VIVER NO INTERIOR É MAIS BARATO?
Embora pequenas, algumas cidades têm o custo de vida tão elevado quanto o de uma metrópole. Os motivos vão desde o fato de se tratar de uma cidade
turística ou com grande público universitário até o caso de abrigarm
indústrias e empresas trazendo recursos financeiros de outro local, o que
gera uma elevação significativa nos preços. Tudo isso faz com que
supermercados, lojas e restaurantes tenham custos semelhantes aos das
grandes cidades.
“A capital perdeu participação no volume de vendas do Estado por vários
motivos. Um deles é que o interior tem recebido muitas famílias com
comportamento de consumo de grandes metrópoles”, diz Ulisses Ruiz Gamboa, economista da Associação Comercial de São Paulo(ACSP).
Outra diferença está no consumo de “modinhas” – elas demoram um pouquinho mais para se materializar nessas cidades. O conceito sustentável, por exemplo, que vem transformando o varejo como um todo e que estourou na capital há alguns anos, chegou ao auge no interior apenas no segundo semestre de 2018.
Lojas com vendas a granel, itens saudáveis e restaurantes naturebas ganham espaço no comércio aos poucos, enquanto a capital acumula uma infinidade deles há um bom tempo. O mesmo ocorreu com as barbearias, gelaterias e afins.
O acesso a orgânicos, por exemplo, ainda é mais limitado que na capital,
onde o valor de comercialização e poder aquisitivo são mais altos. Há poucas opções de quitandas com esse tipo de oferta e poucos pequenos produtores que tentam emplacar o formato de delivery. Em São Paulo, muitos supermercados já operam áreas exclusivas para essa categoria, além dos inúmeros estabelecimentos especializados. (Diário do Comercio)