Demanda aquecida acelera as ofertas de fundos imobiliários
O segundo semestre começou aquecido para o mercado de fundos imobiliários e 2019 prometer ser um dos mais ativos para o setor. Em análise na CVM há R$ 3,83 bilhões em ofertas públicas e outros R$ 8,99 bilhões foram aprovados ou dispensados de registro, entre primárias e subsequentes, desde janeiro. Nem tudo já foi distribuído, mas essas cifras dão uma pista da boa disposição de gestores e investidores para esse tipo de risco.
O tamanho das operações aumentou, mas mesmo assim tem havido rateio em função da forte demanda. Com a Selic na mínima histórica e a retomada da atividade que se vislumbra para alguns setores da economia, o destino do investidor típico de renda fixa tem sido, em boa parte, para os fundos
imobiliários, considerado um meio de caminho até que diversifique a carteira com opções aparentemente mais arriscadas como os fundos de ações.
Somando-se ofertas restritas, distribuídas para um número limitado de
investidores, as operações no primeiro semestre chegaram R$ 11,6 bilhões,
26,5% acima do observado no mesmo período do ano passado, segundo dados da Anbima, que representa o mercado de capitais e de investimentos. Para se ter uma ideia do ritmo que se ensaia para 2019 é que em 2018 inteiro foram captados R$ 14,6 bilhões — e já tinha sido maior volume desde pelo menos 2013.
Ao se analisar a dinâmica do setor lá fora com o tamanho do mercado no
Brasil, dá para ir muito mais longe, afirma Alan Hadid, sócio da BTG Pactual
Asset Management. “Onde vai parar? Só está começando”, diz. “Com a queda do juros para 6% e, muito provavelmente, num futuro próximo, indo para 5%, não tem por que o mercado de fundos imobiliários não ser atraente, com a pessoa física buscando ativos reais, que conhece, sabe que tem o tijolo por trás e que pode ter boa rentabilidade.”
Michel Wurman, sócio responsável pela área imobiliária do BTG Pactual,
acrescenta que nos Estados Unidos, quando se vai para a classe dos fundos
ilíquidos, os imobiliários têm a maior fatia e aqui, entre portfólios
listados na B3 e os não listados o patrimônio limita-se a pouco mais de R$
100 bilhões.
“É um tamanho ínfimo do que pode ser”, diz. Ele cita que enquanto o número de pessoas físicas cadastradas na bolsa ultrapassou a marca de 1 milhão neste ano, os investidores de fundos imobiliários somam pouco mais de 360 mil.
O BTG tem cerca de R$ 19 bilhões em fundos imobiliários e um sinal de que há fôlego para mais foi a recente estruturação de uma carteira para acolher
sete shoppings adquiridos do portfólio da BR Malls por R$ 696,4 milhões. As
cotas, relativas a uma oferta restrita de R$ 900 milhões, incluiu uma
captação excedente para uma emissão de dívida. Os recursos foram levantados em três semanas.
“Os fundos de shoppings foram uma grande mudança. O mercado era dominado por famílias nas décadas de 80 e fim dos anos 90 e 2000, daí começaram a aparecer as empresas listadas [com ações na bolsa], e de um ano e meio para cá os fundos de shopping. Vamos ser um player importante nesse segmento”, afirma Hadid.
As ofertas têm vindo com um volume relevante, em comparação aos anos
anteriores, diz Bárbara Mota Lombardi, gestora de fundos de fundos
imobiliários da Rio Bravo Investimentos. “Temos visto colocação de fundo de R$ 1,2 bilhão, que já nasceu deste tamanho. Antes, víamos operações na casa dos R$ 100 milhões a R$ 200 milhões, agora R$ 400 milhões parece que virou o padrão do mercado.”
Nesta atual safra, o maior fundo captado foi o FII Green Towers, da
Votorantim Asset, que numa oferta mista — primária (R$ 306 milhões) e
secundária (R$ 894 milhões) — atraiu cerca de 7 mil investidores. O fundo
tem como ativo 85% do Green Towers, empreendimento em Brasília composto por três torres ocupadas pelo Banco do Brasil. O contrato de aluguel foi renovado em novembro passado por cinco anos.
Descentralização – A executiva da Rio Bravo também nota uma melhor
distribuição geográfica e diversificação dos ativos que servem de lastro
para os fundos. O setor que sempre explorou mais o sudeste, agora tem
buscado alternativas em outras praças, como, por exemplo, fundos de
shoppings centers e outros ligados a imóveis de varejo no norte, nordeste e
centro-oeste do país. Explorar o comércio fora dos grandes centros de compra também é uma novidade.
“Comprar varejo de rua era coisa que ninguém olhava e agora temos visto
imóveis raros, de altíssima procura e rentabilidade, que têm se mostrado
resilientes em algumas praças nas grandes cidades”, descreve Bárbara. Como exemplo, ela cita imóveis na Rua Oscar Freire, na região dos Jardins, em São Paulo, ou na zona sul do Rio, como áreas que agora têm gestores de fundos imobiliários por trás.
Mesmo com uma grande quantidade de operações chegando ao mercado, as
colocações têm sido insuficientes para suprir a procura do investidor.
“Desde dezembro, todas as ofertas públicas tiveram rateio por causa do
excesso de demanda, fazia muitos anos que isso não acontecia e os
investidores estão levando menos do que gostariam”, conta Lucas Stefanini,
responsável pela área de Fundos Imobiliários da Guide Investimentos.
Ele cita que na oferta da CSHG Logística, de quase R$ 550 milhões,
registrada em junho, por exemplo, quem fez a reserva ficou com cerca de 5% do que desejava. Nas demais, o investidor tem ficado com fatias entre 10% e 30% do que reservou.
“Com fortes vencimentos de títulos do Tesouro, boa parte dos investidores
migrou para outras classes e os fundos imobiliários foram um dos principais beneficiários desse fluxo”, diz Stefanini. Só em 15 de maio o Tesouro pagou R$ 9 bilhões para 122 mil investidores pessoas físicas que tinham Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), lançadas em 2013. “Em um ano entraram praticamente 200 mil investidores neste mercado [de fundos imobiliários], a cada mês tem 30 a 40 mil novos cotistas que nem conheciam o produto.”
Mix de renda variável com fixa – Apesar de os fundos imobiliários serem
classificados como ativos de renda variável, com muito deles com cotas
negociada na bolsa, há a parcela de dividendos distribuída mensalmente
referente ao aluguel, que é encarada como renda fixa. Nessa fatia, não há
incidência de imposto de renda para a pessoa física. Nas ofertas realizadas
neste ano, até junho, 52% delas ficaram com o investidor individual, segundo a Anbima.
“O que a gente está vendo, desde o início do ano, é a primeira grande
migração da renda fixa para a renda variável, incluindo ações e fundos
imobiliários”, diz André Freitas, sócio-fundador da Hedge Investments.
Apesar de a Selic ter ficado congelada em 6,5% ao ano desde março de 2018
até a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de julho, quando caiu para 6%, ele lembra que um ano atrás, as projeções da taxa apontavam para um juro na casa dos 8%, e que agora as estimativas estão em 5%. “O investidor percebeu que tem que se virar nessa taxa de juros, e se acha ruim, insuficiente, o fundo imobiliário é, sem dúvida, uma alternativa
competitiva.”
Se entre 2013 e 2017, as ofertas se restringiam a “fundos de papel”, que
abrigam títulos com lastro em ativos imobiliários (CRI e LCI), ou fundos de
fundos, hoje já é possível comprar o imóvel e trazê-lo para a estrutura de
um fundo imobiliário de forma competitiva com o que se pratica no
secundário, prossegue Freitas. Com vacância alta no setor, a operação não se tornava viável a ponto de garantir o retorno em dividendos (o “dividend
yield”) entre 8,5% e 9% que as cotas de alguns fundos já listados
asseguravam.
Até o ano passado, o investidor buscava um retorno de 7% a 8% em dividendos e agora já aceita alternativas que paguem entre 5,5% e 6%, diz Guilherme Bueno, responsável por fundos de incorporação da RBR Asset Management. “O investidor está topando pagar mais caro na cota porque está buscando renda”, diz, referindo-se a compras no pregão da B3. “No mercado de hoje, qualquer oferta venderia”.
Ele diz que apesar da demanda aquecida, os grandes bancos e demais
estruturadores como XP, Guide e Genial, têm feito um trabalho eficiente de
colocar na rua operações com bom lastro. Com cerca de R$ 2 bilhões em
patrimônio, a RBR vem ancorando ofertas restritas, antes de partir para as
ofertas públicas, tendo incubado seis operações.
Bárbara, da Rio Bravo, diz ver boas perspectivas para os diversos setores.
No ramo logístico, ela cita que o Brasil está muito atrás de pares como o
México, com um parque logístico 20 vezes menor, e sem ter uma relação de
comércio exterior muito diferente. O crescimento do varejo on-line também
ampara a necessidade de novos galpões para os lojistas.
Em lajes corporativas grandes, em áreas como a região da Faria Lima, ela
cita que a vacância, abaixo de 10%, coloca o poder de barganha nas mãos do dono do imóvel. E um segmento que pode capturar imediatamente estímulos como a liberação do PIS e do FGTS são os fundos que abrigam participações em shopping centers. (Valor Investe – Fundos imobiliários -Adriana Cotias)