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Financiamento de construtoras requer atenção sobre os juros

Desde que o mercado imobiliário entrou num espiral negativo, construtoras e incorporadoras empenharam esforços para não perder os já escassos clientes. Junto a brindes e descontos, floresceu no setor a possibilidade de financiamento direto com as empresas, apresentado como uma alternativa aos bancos, que além da burocracia de praxe, passaram a cobrar juros cada vez mais altos no auge da crise. Em geral, as empresas oferecem taxas menos vantajosas que os bancos. Mesmo assim, a negociação pode ser interessante para determinados perfis de comprador.

A construtora e incorporadora Even oferece essa possibilidade. Com juros de 12% ao ano mais IPCA), os interessados podem financiar o imóvel em até 180 meses (15 anos). Já as parcelas são regidas pelo sistema tabela price, no qual o financiamento começa a ser pago com valores mais baixos, que aumentam com o passar do tempo. Segundo o diretor da companhia, Bruno Ghiggino, a vantagem está na facilidade de fechar o negócio.

— É muito interessante para profissionais liberais e autônomos, que têm dificuldade em comprovar renda junto aos bancos. Conosco, isso pode ser feito por meio de extratos que mostrem a movimentação bancária — diz ele, explicando que, como segurança, a empresa faz o instrumento de alienação fiduciária e tem o próprio imóvel como garantia.

Se os juros são mais altos que os praticados nos bancos, Ghiggino afirma que amortizar a dívida é mais prático no financiamento com a construtora, o que ajuda a aliviar o peso da taxa. Justamente por isso, na visão dele, a modalidade tem atraído pessoas que buscam financiamentos mais curtos.

— A gente sempre ofereceu esse serviço de maneira pontual. No início do ano, começamos a divulgar mais e essas negociações já correspondem a 20% das nossas vendas — conta o diretor.

A incorporadora MDL também oferece o financiamento direto de seus imóveis. As parcelas, também pelo sistema price, podem se estender por até 120 meses (dez anos), com juros de 12% ao ano mais IGPM, no caso de unidades prontas, e 12% ao ano mais ICC, para aquelas que estejam em construção. Segundo a responsável pelo comercial da empresa, Ariane Rolim, a análise do cliente é feita a partir de contracheques ou imposto de renda, acompanhados de documentos pessoais, e fica pronta em duas horas. Quando o negócio é fechado, as chaves são entregues em cerca de dez dias.

— A procura está grande e se dá, principalmente, pelas facilidades na negociação. Muitas pessoas não querem se envolver com bancos. Então, preferem fechar conosco. Há quem chegue a comprar dois apartamentos por causa das condições que oferecemos — diz Ariane. — Em alguns casos, é possível fechar até com uma entrada de 5% do valor total do imóvel, quando não tem muita comissão envolvida.

Mas, afinal, vale a pena financiar com os juros mais altos? Segundo o professor de MBA em Gestão de Negócios Imobiliários e Construção Civil da Fundação Getulio Vargas, Paulo Pôrto, com as melhoras na taxa Selic, os bancos já oferecem crédito imobiliário com juros de até 9,5% ao ano. Enquanto isso, uma incorporadora não vai fechar um financiamento com menos do que 10,5% ao ano, além da correção.

— Para se ter uma ideia prática dessa diferença, um ponto percentual a mais na taxa de juros pode representar uma parcela até 35% mais cara. Um prestação de R$ 5 mil iria para R$ 7 mi1 — ilustra Pôrto.

Ele explica que os juros maiores são necessários porque, diferentemente dos bancos, que têm foco nas transações financeiras, essas empresas têm como atividade fim a construção e a venda de imóveis. Logo, assumem um risco maior ao promover o financiamento, ainda que tenham o imóvel como garantia.

Outra desvantagem está no prazo. Ele afirma que os bancos têm mais elasticidade neste aspecto, podendo chegar a 35 anos. Mas, ainda assim, a negociação direta com a construtora pode ser interessante para determinados perfis de compradores.

— Muitas vezes, o banco não aceita aquele cliente, porque ele é inadimplente ou um devedor recorrente. Já as construtoras podem fazer uma equação bem bolada com ele, ainda que tenha que aumentar a taxa de juros para diminuir o risco — reflete Pôrto.

Como qualquer transação que envolva um volume considerável de dinheiro, é preciso tomar cuidado para não cair numa enrascada. Como aconselha o advogado Alexandre Laizo Clápis, sócio do setor de Direito Imobiliário do Stocche Fobes Advogados, os interessados em financiamentos direto com as construtoras devem buscar empresas sólidas no mercado, para que tenham segurança no recebimento do bem.

— É preciso avaliar a situação da incorporadora, especialmente quando o negócio envolve aquisição de imóveis na planta, para não correr o risco de não receber a unidade no prazo do contrato. Para isso, é recomendável uma pesquisa sobre outros empreendimentos da companhia, verificando se todas as obrigações foram cumpridas — detalha ele.

Ainda sobre este assunto, Clápis lembra que o momento atual do mercado pode representar um risco para esse tipo de operação.

— Muitas incorporadoras foram afetadas pela crise que o Brasil atravessa, agravada pelos inúmeros distratos que minaram o caixa das empresas e comprometeram o regular desenvolvimento dos empreendimentos — afirma ele. — Por isso, é importante ter a assessoria de um advogado especializado no mercado imobiliário para ajudar a avaliar as alternativas possíveis em caso de inadimplemento das incorporadoras.

O consultor imobiliário Hugo Cavalcanti, da Nova Aliança, reforça que, além de tomar todos os cuidados, os interessados também devem se lembrar da importância de negociar os valores.

— É preciso ter em mente que a relação deve ser vantajosa para ambos. Hoje no Rio existem diversos imóveis fechados sem demanda. Como as construtoras vivem de construção e venda, o imóvel fechado representa capital imobilizado — cita ele, mostrando como o momento é vantajoso para quem está disposto a pechinchar.

Já o economista especializado em mercado de capitais e professor da Facha Fábio Neves destaca como o comprador deve se planejar para assumir uma dívida dessas.

— O orçamento familiar deve ser capaz de pagar a prestação e sobrar para as despesas habituais, como alimentação, educação, saúde e transporte. Além disso, é interessante ter uma reserva de dinheiro capaz de pagar algumas parcelas, já que o autônomo tem renda variável de um mês para o outro — recomenda ele. (O Globo)

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